Vitor Brauer
A Máquina
Nasceu em 92 a neta bastarda dos Mello
para que tão cedo quanto pudesse
renunciasse a seu sobrenome
pediu desculpas aos bons,
mas não pôde evitar e cuspiu no prato que comeu
sem o mínimo de remorso
Nunca aprendeu a respeitar
as mãos de um velho
que lhe acariciava suavemente o rosto
e lhe pedia com sua voz de pelúcia
que contasse consigo para tudo e qualquer coisa,
mas que fizesse o favor de ficar longe de sua vida

Desde pequena ouvia todas essas besteiras que diziam os esotéricos
egoísta, egocêntrica e artista era sua profecia
nascida no mês de agosto
Logo soube quem era e quem é que deveria ser
mesmo antes que pudesse pensar
mesmo antes que pudesse olhar e ver
que o conceito fechado que lhe criaram
começava a ser absorvido e então já não sabia
qual era a parte que lhe ensinaram a ser e qual era a parte genuína
Mas o mais engraçado é que tudo muda
e ela também mudava, e então a decepção do imprevisível
pois a máquina é sempre programada pra permanecer
os mesmo horários, os mesmo empregos, e os mesmos salários
as mesmas férias na bahia, o mesmo carnaval e os mesmos fracassos

Nada se difere porque nada é especial
porque nada é original e tudo é parte da mesma máquina
que move a todos sempre no tempo certo, na hora do rush
ou que os mantém em casa com os olhos grudados na televisão
nos domingo ou na segunda a noite
Porque ninguém se difere porque ninguém é especial
porque ninguém é original e são todos parte da mesma máquina

Quanto mais você luta, mais você se frustra e mais você repele
Quanto mais você aceita, mais você se sujeita e mais você destrói
Quanto mais você se fecha, mais você se quebra e mais você se fere
Quanto mais você chora, mais você implora e mais você corrói

É, meu irmão, eu sei, quanto mais você se entende mais você fica perdido
E o que a gente vai fazer se quanto mais a gente acha que sabe do mundo mais a gente é destruído
É muito simples - você se torna parte da máquina, você se torna parte da máquina, você se torna parte da máquina

E o que é que você vai dizer quando te fazem crer que o que eles fazem é tudo feito pra você
E o que é que você vai dizer quando te fazem temer os que são tão próximos e que estiveram do seu lado desde a primeira vez
E o que é que você vai dizer quando te encontram com a faca na mão e sua mãe sangrando no que era pra ser o seu lugar e você no alto de um prédio pronto pra pular

E a máquina continua e a máquina continua