Com uma mochila e um caderno
Eu andava em direção ao meu futuro
Fazia meu trajeto diário de 4 quilômetros
Encontrei meus amigos de bairro que iam também para o centro da cidade
Na manhã fresca do interior eu olhava para a montanha gigante que impusera sua presença ao meu lado
Alguns pássaros cantavam e faziam voos rasantes enquanto o ônibus que eu podia pegar, se tivesse dinheiro, acabava de passar
Meus pensamentos eram efêmeros e arredios
Pensar sobre o dia de aula que iria acontecer me fazia querer esquecer da minha vida e viajar para tempos longínquos
Pensar sobre o encontro com a menina que eu gostava, ou que fui obrigado a gostar, também me causava estranhamento
Tudo que eu queria era uma aventura que me tirasse daquele mundo
Sem saber esse pensamento criou raízes no meu inconsciente
Sem perceber eu estava numa selva, como no jogo que jogava na época
E feito um Indiana Jones ou algo parecido eu via uma ruína de alguma civilização antiga a minha frente
Tomado por um espírito de coragem, pois era tudo um sonho obviamente, eu adentrei a construção anciente
Após vários passos me deparei com uma porta com cobras e aranhas desenhadas
Pensando hoje em dia tudo me parece muito clichê
Mas na época tudo que eu queria era esse tipo de clichê ao meu ver
Tocando com a porta com a palma da minha mão esquerda, ela rangeu e se abriu, deixando cair poeira e pequenas rochas
O que se abria então era um palacete repleto de ouro e pedras preciosas
Não sabia como tinha chegado ali, ou onde era esse lugar
A sala iluminada por tochas se apagou magicamente na frente dos meus olhos
O que eu senti então foi um medo profundo
Uma angústia
Um frio
Enquanto o suor saía dos meus poros por todo o meu corpo
Não sei quanto tempo fiquei ali, só sei que me sentei em meio as moedas de ouro e por fim, me deitei
O único barulho que se ouvia era o barulho da terra
Ou seria da água
Dos lençóis freáticos que eu ainda desconhecia naquela idade
Um som grave, mas suave
Um som que possuía uma densidade absurda
Mas que embalava
Com o tempo eu comecei a sentir uma paz
Uma paz ainda desconhecida por mim
Uma paz tão profunda que parecia exatamente o que me envolvia
Uma paz tão profunda que parecia a escuridão
Alguns anos depois, quando já me envolvia em problemas e preocupações reais
Eu tive a mesma visão, agora alto, forte e confiante me mantive acordado
No início já sabendo o que me esperava, tentei compreender meus arredores, tentei buscar um entendimento, mas quando as tochas se apagaram eu não tinha nada em minha mente e em minhas mãos
Me forcei para não me deitar e dormir no palacete
Eu sentia o peso das minhas pálpebras como grandes ogros empurrando pedras na direção da minha córnea
Enfim, deitei, recostei minha cabeça nas duras moedas de ouro do palacete multicor que agora não tinha cor nenhuma
Não existia saída, não existia caminho
Eu não via nada
Então pensei que talvez o caminho era um caminho que não se pode ver
Como o som insistente da terra me levantei e caminhei
Sem abrir os olhos senti uma luz grandiosa, quente, forte mas distante
Andei em direção a luz e ao chegar mais perto senti uma brisa e um cheiro de mar
Sem perceber estava a beira de um oceano
Em uma arca
Uma arca sem vontade e sem vida
E um oceano calado
Um oceano sem vida
Mas um oceano que era só meu