Claudio Botelho
Prólogo
[PRISIONEIROS]
Aaah, aah, aaaahhhh
Aaah, aah, aaaahhhh
Aaah, aah, aaaahhhh
Aaah, aah, aaaahhhh

Olhai, olhai
Pro chão, olhai pro chão
Olhai, olhai
A eterna escuridão

[PRISIONEIRO 1]
No céu o Sol
Não há de arrefecer

[PRISIONEIROS]
Olhai, olhai
Não há o que escolher

[PRISIONEIRO #1]
Não fiz, não fui
Ó, Deus, vem me acudir

[PRISIONEIROS]
Olhai, olhai
Que Deus não vai ouvir
[PRISIONEIRO #3]
No fim, eu sei
Me espera um certo alguém

[PRISIONEIROS]
Olhai, olhai
Pois já não há ninguém

[PRISIONEIRO #4]
Hei de voltar e me vingar
Sem perdão

[PRISIONEIROS]
Olhai, olhai
Pro chão, olhai pro chão

[PRISIONEIRO #5]
Ó, Deus! Meu Deus!
Parai meu coração

[PRISIONEIROS]
Olhai, olhai
Escravo tu serás
Pisai, pisai
Na cova em que estarás
[JAVERT]
Quero o prisioneiro 23623
Chegou enfim vossa condicional
Sabe o que é isso?

[VALJEAN]
Sim, que livre estou

[JAVERT]
Não!
Vais carregar um passaporte amarelo
És um ladrão

[VALJEAN]
Eu só roubei um pão

[JAVERT]
Roubaste um lar!

[VALJEAN]
Quebrei só um vitrô
Era o bebê de minha irmã
Que estava à morte

[JAVERT]
Tu que irás morrer
Se não seguir os trâmites da lei
[VALJEAN]
São dezenove anos nisso aqui
Escravo da lei

[JAVERT]
Cinco porque roubou
O resto por tentar fugir
Sim, 23623

[VALJEAN]
Meu nome é Jean Valjean!

[JAVERT]
E eu sou Javert
Jamais te esquecerás
Por toda vida, 23623

[PRISIONEIROS]
Olhai, olhai
Escravo tu serás
Pisai, pisai
Na cova em que estarás
Aaah, aah, aaaahhhh
Aaah, aah, aaaahhhh


[VALJEAN]
Livre outra vez
O mundo em paz
O vento vem
Entrando em mim
E o céu diz
Que é um novo dia

Água outra vez
Que gosto tens?
Como lavar de mim os breus
E esquecê-los?
O mal e a dor
Salgaram todo meu amor
Mas eis que agora vou saber
Se o mundo vai me receber

[FAZENDEIRO]
Tu vais partir
Aqui não podes ficar
Aqui tens tudo o que é teu
Não deves voltar

[VALJEAN]
Só me destes metade
Ao que dais aos demais
Eu suei como um cão
E não me pagais

[FAZENDEIRO]
És um ladrão
E todos sabem, eu sei
Não hás de receber
Como quem está na lei

[VALJEAN]
Eis que o mundo é um prisão
E vão as portas se fechando para mim
E não importa aonde eu vá
No passaporte eu levo a marca de Caim
Quanto mais andei, ouvi:
"Ninguém te quer aqui"

[ESPOSA DO ESTALAJADEIRO]
Não há lugar
E já não há o que comer
Eu bem que gostaria
Mas não posso atender

[VALJEAN]
Um celeiro qualquer
Uma lasca de pão
Não podes me enxotar
Pois eu não sou um cão

[ESTALAJADEIRO]
Tu vais partir!
Tu vais por bem ou por mal
Não vamos receber aqui
Um marginal

[VALJEAN]
E eis então que a liberdade
É essa corda no pescoço
Isso é a lei
Um passaporte que me leva
Eternamente pro inferno
Isso é a lei
Como um cão
Só faço andar
O chão é meu lugar

[BISPO]
Meu senhor, se tendes frio
Vos convido a pernoitar
Somos pobres, temos pouco
Mas podemos partilhar

Revivei com nosso vinho
Renascei do nosso pão
Nossa cama vos recebe
Descansai vossa aflição

[VALJEAN]
Me deu o que comer, minha fome então matei
A prata em minhas mãos valia muito mais
Que tudo que eu já vi, que tudo o que eu ganhei
Então confiou em mim

E fez sua boa ação, eu me fiz de homem bom
Mostrei a gratidão, de todo coração
Mas eis que logo mais vão todos descansar
Pego a prata, vou escapar

[POLICIAL #1]
Conta agora a tua história

[POLICIAL #2]
Vamos ver se vai colar

[POLICIAL #1]
Foste hóspede, pois sim

[POLICIAL #2]
O bispo quis te acomodar
E ao ouvir os teus desvelos
Por bondade ou compaixão

[POLICIAL #1]
Resolveu presentear-te com esta prata

[BISPO]
Certo então

Mas amigo, não te lembras
Que foi mais que te ofertei?
Esqueceste sobre a mesa
Os candelabros que te dei

Meus senhores, é verdade
Os presentes eram meus
Libertai o prisioneiro
E segui na paz de Deus

Meu irmão, jamais te esqueças
Que o destino quis assim
Usarás o que te entrego
Como um meio e não um fim

Para ser de agora em diante
Um honesto cidadão
Deus te deu mais esta chance
E eu abri teu coração!