Claudio Botelho
Solilóquio (Suicídio de Javert)
[JAVERT]

Mais uma vez
Esse demônio que vem
Me perseguir outra vez
E dar-me o troco também
Quando ele pôde vingar
E decretar o meu fim
Pra se livrar
Do seu passado e de mim
Um gesto só
Só um golpe fatal
Mas ele quis que eu vivesse afinal
Não vou viver pela mão de um ladrão
Não vou dever minha vida ao mal
Eu sou a lei e a lei não tem dó
Eu vou cuspir a palavra fina;
Sobre toda a piedade que houver
Pois vai ser Valjean ou Javert!
Como é possível conceber
O seu domínio sobre mim
Um homem que eu vivi caçando
A vida me dá, me deixa vivo
A minha morte em suas mãos
Por que não fez?
A minha hora já chegou
Mais vivo estou… No inferno estou!
É preciso pensar
Se a verdade ele diz
Deve ser perdoado
Seu destino infeliz?
E hoje eu ando a duvidar
Logo eu que nunca duvidei
Meu duro coração balança
Meu mundo caiu, e tudo é sombra
Ele é o mal ou é o bem?
O sim ou o não?
Se hoje a vida me salvou
Desatinou-me o coração
Eu me afundo em confusão
Céu de chumbo sobre mim
No vazio, olhos meus
Os princípios não têm fim
Desse mundo vou sair
É o mundo Jean Valjean
Já não há lugar pra mim
Já não há um amanhã…