Victor Mühlethaler
Canção da Avó
[AVÓ, falado]
— Ele era um grande filho da mãe

(cantado)
Aquele infeliz me fez aguentar
Trinta anos de inferno – Por que fui casar?
Gastava todo dinheiro na mesa de um bar
E não movia um dedo
E então quando vinha bebum
Era um tal quebra-pau e era comum
Me lançava a mão sem remorso algum
E eu xingava em segredo

Só que dançando... era um grande par
Era o céu, era a terra, era o sol, era o ar
E nos seus braços vi o que era amar
Pois no salão não há tempo ruim
Mas tudo que é bom chega ao fim
E o outro dia era um porre

Era um beberrão, um falastrão
Tinha cecê e um bafo do cão
Sempre mamado e metido a brigão
E ele não movia um dedo
Eram tempos ruins que não prestam mais
Homem na frente, mulher sempre atrás
E a mulher pra sair da casa dos pais
Só com um anel em volta do dedo
Só que dançando, ele era Fred Astaire
E eu me sentia então a mais linda mulher
Sem poder esbanjar um centavo sequer
Mas no salão tudo vira canção
A tristeza vira paixão
Mas o outro dia era um porre

Queria voltar anos atrás
Sem um homem, pra eu viver em paz
Eu não fui tão forte, mas tanto faz
Viver não é brinquedo
Tarde demais, deixei passar
Hoje não dá mais pra sonhar
Mas se eu pudesse recomeçar
Eu daria a todos o dedo

Só dançando, sem nem me importar
Solta no salão, suspensa no ar
Num balé só meu, e sem deixar
De desejar uma vida além
De ser a esposa de alguém
Viveria só de porre
Viveria só de porre