[Letra de "Paulo"]
[Verso 1: Phedilson]
19 de novembro 1987
Nascia o Paulo, filho do Mário e da Iveth
Menino saudável, grande, 4 kilos e 100 gramas
Felicidade da mama mesmo após a cesariana
Terceiro filho do casal, depois do César e a Ana Paula
Mas esse era especial, dizia sempre o pai lá no bairro
7 anos depois, directo para escola
Onde aos 12 anos mostrava ter talento com a bola
Pai orgulhoso e satisfeito, era o filho mais mimado
Claro, menino bonito, inteligente e educado
Depois tiveram um outro filho chamado Ricardo
Porém, não obstante a isso era Paulo o mais amado
[Ponte: Soldier]
É tão lindo
Família feliz, família feliz
Tendo o filho
Que o pai sempre quis, que a mãe sempre quis
[Verso 2: Phedilson]
Mas passaram-se alguns anos e deu-se o surgimento espontâneo
Da baixa produção do pigmento cutâneo
Melanina foi baixando gradualmente e sem noção
Do que se passava a família assustada ficou sem chão
Paulo passou a ter manchas brancas em todo o corpo
Os colegas na escola estigavam e chamavam de porco
Choravam num canto da escola o tempo todo
Não assimilava a matéria e os professores chamavam de tolo
Afastado da equipa de futebol por precaução
O maior sonho do rapaz foi se transformando em frustração
Auto-negação, odiava olhar-se no espelho
Tornou-se sens-ivel ao sol, mudou-se-lhe a cor dos pêlos
Mudou-se-lhe o tratamento, por parte dos próprios pais
O filho amado e desejado, agora é visto como um fardo
É vitiligo, doença rara e por sinal
Nem os hospitais na região sabiam por onde começar
Os familiares diziam ao Mário que era feitiço
Que era coisa das trevas e que a família da Iveth fez isso
Ignorância é instrumento do diabo
Então a relação dos pais foi-se destruindo aos bocados
Conflitos constantes, meses depois separação
A culpa é toda tua Paulo, diziam os irmãos
E ele vendo tudo isso se tornou depressivo
Com comportamentos suicidas, Tornou-se Auto-Destrutivo
Não tinha amigos, vivia trancado no quarto
Todos os dias ouvia a mãe em casa a lamentar nos cantos
Gostava de uma miúda, Carla, vizinha da casa ao lado
Mas um dia ouviu a Carla o chamar de queimado
Mente poluída pela dor e desgaste
Pelo desgosto de ser rejeitado por quem mais amava
Achava que Deus não o ouvia quando se ajoelhasse
E quando dizia que o mundo para ele não era um bom lugar
Não sabia dialogar, cada vez mais introvertido
Absorto e introspectivo, mas pouco ou nada agressivo
Só punha-se a si próprio quando fechava a porta do quarto
Cortava-se um pouco e sentia algum alívio
[Ponte: Soldier]
Tú não imagina o peso num ser humano
Rejeitado por todos
Preso no sofrimento ele é humano
Que precisa de um pouco de Amor; Habituado sem amor
Ensinado a duvidar do (próprio) valor
Refém do ódio e da dor, Refém da escuridão
[Verso 3: Phedilson]
E já nem na rua jogava, perdeu o entusiasmo
Porque lá no bairro diziam que não jogavam com o esquisito
E no mesmo ano, por doença faleceu Ricardo
A 19 de Novembro o que fez desse dia maldito
E novamente os pais de Mário, para cima da mãe de Paulo
Chamando-a de feiticeira, diziam, Culpa do teu filho
Não pode ser coincidência na data de nascimento de um irmão morrer o outro, Isso so pode ser feitiço
Mas Ricardo era sensível, sofria de pneumonia
Novembro chove demais ele pegou chuva nesse dia
Detalhes simples, mas nenhum deles sabia
E novamente afetou a Paulo a ignorância da família
Após semanas de sufocu Iveth decidiu mudar-se
Para uma nova província e ver se dava um novo passo
Mas quase nada mudou, a história se repita
Família disfuncional agora mais se dividia
E foi no 7 de Março que paulo fugiu da nova escola
Quando voltou a sofrer na pele aquilo que chamam de bullying
Quando viu repugnância nos olhos da professora
Quem devia defender agiu como perfeito cúmplice
Chegou a casa transtornado, cortou-se um bocado
Mas nem isso o acalmava quando lembrava os maus bocados
Preconceito é arma, decidiu suicidar-se
Mas já com uma corda na mão ouviu a voz do anjo
[Outro: Soldier]
Oh menino
Tens de te acalmar, tens de te acalmar
Tu tens um futuro tão lindo
Tudo vai mudar, tudo vai mudar
Oh menino
Tu tens um futuro tão lindo