Criolo
Criolo, ‘Espiral de Ilusão’ (Análise)
Depois de já uma drástica mudança em sua sonoridade responsável pela guinada em sua carreira, Criolo novamente faz aposta e envereda no samba
O paulista já estava envolvido no universo hip hop há muito tempo quando lançou, em 2006, sua estreia Ainda Há Tempo. Foi um grande trabalho com espaço cativo no cenário underground, mas ficou desconhecido do grande público—ao menos até ser revisitado em 2016, quando o rapper lançou uma edição comemorativa de dez anos. Foi em 2011 que aliado às mentes de Daniel Ganjaman e Marcelo Cabral, estourou e conquistou fãs extrapolando o público do rap. Não à toa, Nó na Orelha é o melhor disco do gênero dos anos 2010.

Três anos depois veio Convoque Seu Buda e a consagração de seu nome e estilo único. Agora com Espiral de Ilusão outra guinada: influência na sua formação, o estilo que teve nomes como Jards Macalé e Itamar Assumpção em sua vanguarda nos anos de 1980, além dos clássicos como Adoniran Barbosa e os Demônios da Garoa, é o qual Criolo navega, não abandonando sua linguagem do rap.

Onde o rap e o samba se coincidem? Seria essa nova aposta do compositor um acerto? Afinal, Criolo é rap ou não?

Confira abaixo as análises e notas da equipe:

>> Texto originalmente publicado no blog You! Me! Dancing! <<O Espiral de Ilusão é um disco que deve ser ouvido coletivamente, de preferência em um local onde você e os presentes possam cantar os refrões em coro. A roda de samba, enquanto uma experiência construída não só pelos músicos, mas também pelos presentes no entorno, é invocada e representada fielmente por Criolo. Em alguns momentos ele parece até fazer referência aos sambistas antigos em sua entonação. Em entrevista, o próprio admite que respeita muito o estilo e tem a dimensão da importância do samba para o povo brasileiro. Da religiosidade até a reforma da previdência, Criolo mobiliza diversos temas em suas letras que, como de praxe, se entende na medida em que o tempo passa. As letras são um ponto importante do álbum, seja pelas temáticas ou pelos significados a serem desvendados. 'Saudosa Maloca' do Adoniran Barbosa, que quase todo mundo é capaz de cantar de cor, é uma canção sobre expropriação. Sobre uma transformação da cidade que depende da remoção dos alojamentos populares para que se dê lugar aos edifícios de luxo. Assim, a crítica social pode estar contida nas canções de variados gêneros e principalmente naqueles que emergem da população pobre. Pode soar estranho a princípio que um disco de samba tenha sido feito por um MC. No entanto, é muito compreensível se entendido dentro desse contexto: de um samba que é memória afetiva do passado e forma de expressão popular, cantá-lo hoje é prestar homenagem e também criar.—Marta BarbieriEspiral de Ilusão é algo novo, porém nostálgico, resgata o samba tão aclamado nos idos tempos de Adoniran Barbosa, João Nogueira, Cartola, entre tantos outros grandes sambistas, como Martinho da Vila e seu laraiá. Criolo consegue retomar sua carreira homenageando esse gênero tão importante para a cultura brasileira e que ele já demonstrou seu amor e interesse pelo estilo, seja em trabalhos anteriores, seja em entrevistas. Revive a vontade das rodas de samba nos bares cantando os coros dos refrões seja em alegrias ou em desilusões amorosas (tanta gente na porta de bar / que vive a sorrir, que vive a chorar), passeando entre faixas melancólicas e agitadas. O músico consegue entrelaçar diversos assuntos em poucas linhas, surpreendendo nas composições românticas e reafirmando seu olhar delicado pras críticas sociais (mozinho tá longe / eu vivo a sofrer / me aposentar só depois de morrer), além de enaltecer as raízes africanas, as mulheres e retratar assuntos do cotidiano da periferia. Com uma competente produção, o clima das músicas acompanham muito bem as composições e a voz do artista que faz interpretações de um mesmo tema em ritmos diferentes, mostrando versatilidade ao se distanciar por completo do rap. Em suma, é um disco cheio de angústias e frustrações, sentimentos que desaguaram num gênero característico e que devemos celebrar em coro e com samba no pé. Oh laraiê!—Matheus BarrosMembroNota Ruthe Maciel10 Igor França8 LKSZZ8,5Marta Barbieri8,3Pellizzle8ramoshenrique7ThiagoLeve7,5Kray9JVitorFelix9Matheus Barros8,5
Revisitando antigos nomes e ainda com sua linguagem urbana, herança do rap, Criolo manda bem no seu passeio pelo samba, cantando o asfalto e o morro como há certo tempo não se via no samba paulistano. Aliado a ótimos músicos, mais uma vez o compositor acerta em sua mais recente guinada.